Há 15 anos à frente do Sindicato dos Artistas, Hugo Gross tem a difícil batalha de não permitir a banalização da categoria. Como já falamos aqui, a busca incessante por mais audiência tem feito emissoras de TV investirem no recrutamento de influenciadores digitais de alto engajamento nas redes sociais para seu casting de atores, mesmo que estes não tenham registro profissional para atuar. Cabe ao sindicato fiscalizar e controlar para que atores profissionais, que de fato trabalharam ou estudaram para terem seus respectivos DRTs, não percam espaço no mercado para dar vez a pessoas sem qualificação, somente pelo fato de estarem ‘na crista da onda’ da internet. Em conversa com a coluna, o presidente do sindicato falou sobre a valorização da classe artística e de como tem sido lidar com a mudança no mercado da dramaturgia – que cada vez mais vem fazendo atores profissionais perderem espaço.
Há quanto tempo você está à frente do sindicato?
Estou dentro do sindicato há 15 anos.
Qual é o maior desafio do sindicato?
O maior desafio nesse momento é mostrar que realmente é um sindicato de ponta, onde a gente trabalha com seriedade, união e determinação para que ele seja respeitado, para que ele tenha como exemplo a Academia de Atores de Hollywood, onde o artista, o associado, o técnico, tem o seu respeito. Isso é importante pra uma classe, principalmente pra um sindicato que oferece serviços e protege o nosso associado, que é a nossa categoria.
Como você vê a proliferação de influencers na TV?
Eu não concordo com influencers na TV. As emissoras, como empresa privada, acho que têm o direito de escolher quem quiser, mas pra isso tem uma tramitação. Pra isso a gente tem uma autorização especial específica para cada personagem. Mas no fundo, eu, como entidade, fico triste, porque temos tantos atores e atrizes maravilhosos, jovens que passaram por uma faculdade, que fizeram cursos profissionalizantes e estão aí querendo um lugar ao sol, estão precisando disso. Então, como entidade, não posso concordar, independentemente de uma pessoa ser influencer digital com tantos seguidores e começar a fazer sucesso e querer fazer novela e ser um ator. Assim a gente está banalizando a categoria, principalmente a nossa lei, que é a lei 6533/78, que realmente modificou toda uma história do teatro e de interpretação dos artistas no Brasil.
Qual foi a sua maior briga até hoje?
Atualmente a minha maior briga é pela valorização da categoria, dos atores e atrizes, dos técnicos dentro do sindicato para que eles sejam respeitados, contratados e trabalhem com alegria, pra que a gente consiga ver uma categoria muito mais feliz com muito trabalho.
Sente falta de atuar?
Gosto de atuar, mas também faço muita leitura dramatizada, faço espetáculo… Eu tenho um projeto agora de voltar a montar o espetáculo ‘Capitães de Areia’ ou a própria ‘Gaiola das Loucas’, que eu fiz com o falecido Jorge Doria, que me ajudou muito. Mas de uma certa maneira, eu estou sempre em movimento dentro da área artística.
Você foi um galã da Globo nos anos 90. Como você vê as mudanças na emissora?
Muito obrigado, mas continuo galã (risos). Eu acho que o pertinente, pelo mundo que a gente vive hoje, as coisas estão mais rápidas, as emissoras têm que acompanhar e a gente também. Mas acredito que dentro da legalidade, dentro do respeito e realmente valorizando o artista dentro de um âmbito geral.
Voltaria a atuar?
Claro. Eu gosto de atuar. É importante pro ator e importante a gente voltar a trabalhar. Tenho esse projeto de voltar a fazer teatro, voltar a fazer novela… É importante, todo mundo gosta. Por mais que eu esteja me dedicando à nossa categoria, a gente tem esse desejo e é muito gostoso também ser reconhecido não só por um trabalho mais político, através do sindicato, mas também por atuar.
Já te ofereceram dinheiro em troca de um DRT?
Nunca me ofereceram porque sabem como eu sou. Eu também não iria aceitar, até porque ninguém está aqui pra proibir ou atrapalhar o sonho de alguém. Então, o DRT tem que ser dado pra quem realmente comprovou durante um período, um número ‘x’ de trabalhos, ou fez um faculdade de artes cênicas e está apto pra isso. Se não, novamente eu falo que a gente banaliza a nossa categoria, nossa classe, a nossa carreira tão linda que é a carreira artística.
Você se decepcionou com a profissão de ator em algum momento?
É uma carreira maravilhosa, brilhante, que eu sempre fiz com amor, com dedicação. Pra fazer novela eu batalhava, pedia ao falecido Paulo Ubiratã, ao Roberto Talma, que me ajudaram muito. O próprio Papinha, que é um cara excelente. A gente tem excelentes profissionais, tanto na televisão quanto no teatro. Não me decepciona não, porque é uma batalha. Aliás, tudo na vida é uma batalha, né? Então, quando você tem determinação, você vai fundo e, principalmente, a carreira é feita com amor. Onde tem amor, que é a base de tudo, tudo anda conforme manda o figurino.
Pedidos como os de Juliette são corriqueiros?
São. Bastante. Mas estamos aqui pra filtrar isso, porque não é justo uma pessoa que não se dedicou e simplesmente porque é influencer e fez um programa que não é artístico, tomar o espaço de um ator, de um colega, de um amigo que você vê nessa luta diária batalhando dentro do teatro, passando o chapéu, batendo na porta de produtores de elenco das emissoras de televisão… Então a gente vai sempre negar. E agora, mais do que nunca, a gente vai filtrar isso para que as emissoras respeitem isso. Digo todas as emissoras que são coligadas ao Rio de Janeiro e vou fazer contato com o pessoal de São Paulo para que a gente continue lutando por isso: para cada vez mais moralizar a nossa instituição.
Fonte: https://odia.ig.com.br/colunas/fabia-oliveira/2021/09/6242382-nao-concordo-com-influencers-na-tv-diz-hugo-gross.html